Ordena aos que são ricos (1 Tm 6.17). Visto que muitos dos cristãos eram pobres e oprimidos, é provável que, como geralmente sucede, fossem desprezados pelos ricos; e esse poderia especialmente ser o caso em Éfeso, que era uma cidade opulenta; pois, em tais regiões, o orgulho costuma ser ainda pior. Aprendamos, pois, desse fato quão perigosa é a abundância das coisas materiais. Paulo tem boas razões para dirigir especialmente aos ricos uma advertência tão severa; seu intuito é remediar os erros que quase sempre acompanham as riquezas, precisamente como nossa sombra acompanha nosso corpo; e tal coisa se dá pela depravação de nossa mente que faz dos dons divinos ocasião para o pecado. Ele menciona especificamente duas coisas das quais os ricos devem precaver-se, ou seja: o orgulho e a falsa segurança - a primeira oriunda da segunda. Nem depositem sua esperança na instabilidade das riquezas foi adicionado para que Paulo atraísse a atenção deles para a fonte de seu orgulho. A única razão pela qual os ricos se tornam insolentes e se deleitam tão acentuadamente em cultivar o desprezo pelos demais é que se imaginam especial e supremamente ditosos. A vã confiança vem primeiro, e a arrogância vem logo a seguir.
Quando Paulo desejava corrigir esses erros, primeiramente ele fala desdenhosamente das riquezas, pois a frase, do presente mundo, tem o intuito de rebaixá-las em nossa estima. Pois tudo o que pertence a este mundo participa de sua natureza, por isso ser o mesmo tão transitório e passar tão depressa. Ele mostra a falsidade e a fatuidade da confiança que é posta nas riquezas, lembrando-nos que nossa posse delas é algo tão transitório que se assemelha a uma coisa desconhecida. Pois quando imaginamos tê-las, como um relâmpago escapam de nossas mãos. Quão estulto é colocarmos nelas nossa esperança!
Mas no Deus vivo. A pessoa que chega a compreender isso não encontrará dificuldade em desvencilhar sua confiança das riquezas. Porquanto é unicamente Deus quem provê todas as coisas para os propósitos necessários de nossa vida, e quando depositamos nossa confiança nas riquezas, na verdade estamos transferindo para elas as prerrogativas que pertencem exclusivamente a Deus. Note-se o contraste implícito ao dizer que Deus distribui liberalmente com todos. O significado é o seguinte: mesmo que possuamos plena e rica abundância de todas as coisas, na verdade tudo quanto possuímos procede da mercê divina. E tão-somente sua generosidade que nos supre de tudo quanto carecemos. Segue-se que é um terrível equívoco confiar nas riquezas e não depender completamente da mercê divina, na qual há para nós suficiência, alimento e tudo mais. Portanto, concluímos que somos proibidos de confiar nas riquezas, não apenas com base no fato de que pertençam só a esta vida mortal, mas também porque não passam de fumaça. Nossa nutrição não procede apenas do pão [material], mas de toda a munificência divina [Dt 8.3].
Ao dizer, ricamente, ele, [eisapolausin], ele está descrevendo a imensa liberalidade divina em nosso favor, em favor de toda a humanidade e em favor de todos os seres irracionais; sua mercê se estende para muito além de nossas necessidades [SI 36.6].
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